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cartógrafo de letras, sensações e pássaros

8.04.2020

TEXTO 180 : UM POEMA PARA A ESPERA NO TELEFONE OU APLICATIVO




toda vez que me diz
que estou perdendo dinheiro
ou o tempo que não
dá retorno
e passo horas no SAC
aguardando minha vez
pra ser ouvido
pra fazer reclamação
ou pra alguém que
possa me ouvir
em tempos de desespero

minha gerente
meus associados
meus finos empregados
todo corpo que me rodeia
juro que vou pagar
em verso 
em prosa
e o que mais aceitar

7.31.2020

TEXTO 179 : UM POEMA PARA DEPOIS DA IDADE




QUANDO COMPLETEI CEM ANOS

quando completei 100 anos
aquilo ainda nem era número
e como coisa de menino comparei
sem vergonha do que não cabia na mão
troquei sem saber
dezessete por um radinho
vinte e seis por sorvete
doze a mais porque queria de novo
e uns que não fiz mais questão
dei numa bola pra meninada
gole de cerveja gelada imagina valia milhão
então aos poucos a vista voltou
os cacoetes estirados ao sol
papagaio que sabia chopin
vinha de pouquinho no meu ouvido
eu rindo e rindo as pernas
de costas para a noite 
já passando a hora de dormir, esquecer
e essas bobagens de gente careta demais

7.27.2020

TEXTO 178 : UM POEMA ENCLAUSURADO




ESPELHO

porque gosto
então me vejo
a casa, os pés, a manhã
gosto

se discute vícios
a falta deles
dias pra chegar
coisa assim, manejo

família, gente
dentro da palha
penosa casca
superfície do veludo

o nojo, o vulto
freguesia entardecer
eu, a imagem do espelho
dentro do esperado seu

irradia tarde enfim
gorgeio que vem
poleiro sem ave
meneio sem aceite

coisa de virar
a cabeça em pé

7.24.2020

TEXTO 177 : UM POEMA GESTO DE PAZ




uma lição de desigualdade
valor íntimo das semelhanças
peço perdão prece
quanta gente pra olhar vê

tem nome tem tudo
como a gente não gosta
mas chora porque sorri
e quando quer ter casa viver
respira

garoa não importa
molha deixa ficar tudo tudo
a menos que a porta abra
a casa a familia o cachorro o carro o véu

fala quanto tempo fala
olhar mais que importa é a falta
agora a comida a vela a mesa
fazer as mãos juntas vive em si em dois

e não é mais obrigação
quem acolhe é lei gentileza glória
herdará tudo o que for 
pó ante o pó final finda história

lá fora gilete a polícia o cacete
tira logo o pé da lama
como você se chama
como você tá firmeza tudo legal

ao vocabulário da paz relembre
fatiar divide 
o filho irmão de paz
não duvide da ferida e do ferido
entregue ao outro a mão aberta
amar outrem amém

7.14.2020

TEXTO 176 : UM POEMA DA GENTE



e quando a corrente bateu
antes das 4
silêncio de tremer o corpo
gente que não acaba mais

às vezes de si mesmo
às vezes figura disforme
massa pulsante
sem nunca ouvir a palavra alegria

as sete jantar na mesa
criança deságua de não querer
imagem e semelhança de quem
largou ou ficou pra ver crescer

aos dezessete já sabendo
de corte à navalha, suor de virilha
a cor da pele o cheiro da noite
que dois e dois são muito pra um

evitar o tempo, palavra proibida
importa mais ressoar a prece
hoje, só hoje meu deus, meu amor
ficar feliz porque felicidade tinha nome

e quando voltar para casa
aquilo já era floresta
as figuras todas turvas
viela lá longe, família unida, mãos nos cabelos

gente que segue crescendo

6.30.2020

TEXTO 175 : UM POEMA GESTADO EM QUARENTENAS




ave mãe
que
choca o novo ministro

reina a paz do ouro
tudo tudo outra vez
meu pai, meu país
aponta para onde?

ridículo mistério
esqueletos adoçam o café
outra notícia que passa
minha canção cansada
tudo outra vez

curioso silêncio
das nossas crianças
gloriosa era inconformada
vitamina em forma de fertilizante

recomeço
por onde pega o mal
debaixo ou de cima
pousa breve
ave pássaro manchado

elaborando a teia
que acresce de pura
matéria elástica 
embalagem descartada
choca 

a reunião de gentes
está proibida
de agora em diante
um por cada um
e todos por ele
afilhando a lâmina gasta
com brio com excelência

espero
que cairá 
com duro golpe



TEXTO 174 : UM POEMA SOBRE INFINITOS



tenho
tenho infinitos
tenho pra mim

gente feita de números
como se sábado
fosse um dia
como outro

me afastei do tempo
da pressa e da dor

não tenho paz


4.19.2019

TEXTO 173 : UM POEMA DE MENINO



semáforo pisca
imagem cansada
sentada no olho
menino insiste de ser
coisa absurda viva

,sábado outra

entre o minuto menos
palha que recobre
coisa mais estranha
deu de dar
fome de caroço
garganta nuvem garapa

sem entender nada
descansa a mão
conversa cala a
perder de vista
mãe nossa

a falta que faz dizer
cada coisa seu nome
cada uma
feliz em ser
,feliz

menino de vidro
hora luz
menos a menos
outra história
mesma coisa

vela, vala
fresta da festa
menino no olho

menino de gente
supetão feliz, feliz
mostra da gente

casa abandonada
imagem que
cai, reconstrói
mata

nos pés da gente
mesmo
olho de vídeo
descascado viscoso
coisa nova que não cabe

misericórdia menino
amanhã ainda
que não consta
dizer se basta



TEXTO 172 : UM POEMA DE 2019




é momento de colher
e de semear
no dorso do próprio nome
a palavra
umbigo ganha uma
circunferência grotesca
o som dos que
pediram por mais
amor
é uma coisa pequena
e que cresce de noite

sexta-feira

5.10.2018

TEXTO 171 : O SILÊNCIO DOS HOMENS QUE MASTIGAM PREGOS EM PALETÓ




largo do arouche
cidade que arrasta para trás
nunca antes as manhãs viram
homens adultos se amando de
peito nu
a tragédia arquitetada
não dura mais que um semáforo
eu sei disso
porque enquanto
a vida se dissolve
em camadas e mais camadas
há alguém que liga equações
aos fios desencapados
gosto quando fica assim
cheio de flores e
posto reposto
já disse de outra vez
vai acabar quando isso meu deus?

TEXTO 170 : DO QUE APRENDI CULTIVANDO O MEDO




de mim
no mais a mais
que é muito
    sobejo

lampião lampejo
escorre gota
      faz inseto
feito percevejo

lábia labore
mínimo mimo
a cruz em
credo
sou mais
eu mesmo